quando dou por mim já cheguei ao fundo, de dor contínua de falta de prazer intermitente com excepção dos restos que vagueiam no fantasma da tua sombra, que vem como uma mão quente e poética, que me agarra pelo pescoço enquanto me beijaste e, que sufoca no pensamento de que agora isso são só sonhos, mesmo que venham em forma de pesadelo. Hoje foi tão real, hoje senti que o sonho tinha transparecido para a realidade, em que te ver provocava um impulso tão grande que parece que o meu coração tinha estado em standby até aquele momento. Atirei tudo ao chão enquanto o meu coração rasgava por dentro, porque já não sabia o que era viver outra vez, atirei tudo enquanto corria na tua direcção só para poder chegar a ti mais depressa. Tudo era areia à nossa volta, a noite já tinha caído e chorava um pouco através das estrelas que pareciam querer cair para o mar e, morrer. Aquele segundo em que embati contra ti, em que o meu peito encostou-se ao teu e, a minha cabeça encostou-se nos teus ombros e, como não consegui aguentar os meus abraços de quase te sufocar. Aquele embate, neste sonho, foi o momento mais vivo que já senti desde que deixei de sentir a tua pele. Não te procurei beijar, só quis aquele abraço teu sentir que tu ainda existias. Estavas com aquele casaco preto que um dia te fez tão feliz quando te comprei nos anos. A luz batia no teu cabelo, ainda com os caracóis que tinha deixado. Eu já nem conseguia usar lágrimas como forma de expressão, só um sorriso, um bater de coração que eu não conhecia e os meus braços a agarrar.te para não te deixar ir embora mais uma vez. Depois fomos de volta, ao sítio onde tudo começou. Ver tudo o que tinha deixado para trás, mas agora com a demonstração de que estive fora, as pessoas, as coisas, permaneciam as mesmas, mas o curso da história já tinha mudado. Já não era eu que te segurava mão. A certo ponto, sentei-me ao pé de ti, falámos de muita coisa, e só sentia o meu coração prestes a rasgar sem reparo, só por ter o calor do teu corpo perto do meu. Tu sentias todo aquele meu desespero, toda aquela morte reflectida na minha cara e, naquele momento percebeste o quão eu sou nada sem ti, o quão éramos tão perfeitos juntos, com os nossos duetos, com as nossas tardes, com os nossos almoços românticos no sítio provavelmente no sítio menos romântico de sempre, com um hamburguer que era o nosso. Faz-me lembrar o primeiro beijo. Nós sentíamos tudo isso a arrebatar-nos, já não conseguias suprimir, só atenuar o efeito na tua expressão. Mas há aquele momento, em que não há expressões, não existem palavras, é só o tocar na ponta dos dedos, aquele arrepio que arrasta tudo por dentro e, beijaste-me o pescoço, aquele espaço só teu. Eu ainda olhei mais profundamente, ambos sabíamos que só tínhamos mais um segundo, até as consequências caírem, até tu me odiares mais uma vez e nunca mais me quereres ver. De certa forma, eu reconhecia esse momento de perda mais uma vez, e então beijei-te. Aí, sim, chorei. Tu fugiste porque alguém te perguntava como, como. Existia tanto no porquê, que nem existia uma resposta para isso. Eu era a estúpida, a destruidora, que tinha deixado tudo por aquele momento.
Era um sonho. Surpreende-me como cheguei mesmo ao fundo, em que um momento num sonho faz-me sentir viva e mostra-me o quanto estou morta por dentro.

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